Página dedicada a mi madre, julio de 2020

Maria da Graça Freire

As estrelas moram longe

1946

 

 

 

A morte de Benjamim Trovisco

Bastava olhá-lo de relance para se perceber que era uma criatura bem instalada na vida. Ao chegar aos quarenta anos, depois duma luta árdua e ininterrupta pela conquista do seu lugar, todo ele denunciava sintomas inequívocos de abastança, desde a cabeça inclinada para trás, ao ventre proeminente e aos anéis que chispavam magnéticos clarões nos seus dedos.

Estas e outras qualidades faziam de Benjamim Trovisco (o apelido denotava a sua origem humilde: filho de Ambrósio do casal do Trovisco) pessoa largamente estimada e conceituada.

Fraco, se fraco se pode chamar a esse seu aprazimento, conhecia-se-lhe apenas o de uma acentuada predilecção pelo belo sexo, com o qual era extremamente liberal. É possível até que esta apreciação seja absolutamente contrária aos intuitos que o moviam. No fundo, não seria mais que um benemérito a procurar reparar de alguma maneira pequenas bagatelas, leves pecadilhos de consciência ocorridos no tempo em que começara a sua vida de negócios… A incompreensível pobreza duma viúva, cujo procurador fora, e outras insignificâncias sui generis

A sua honestidade, agora absoluta, aumentara-lhe proporcionalmente aos cabedais; e que esses pormenores não tinham importância, reconhecia-se plenamente na sua expressão beatífica, ingénua e alegre.

Benjamim Trovisco viera à cidade e resolvera empregar o tempo que lhe sobrava duma lucrativa especulação, da forma mais agradável e inocente, com um velho conhecimento.

O local, um restaurante dos arredores, era propício. Debaixo daquele caramanchão coberto por uma trepadeira florida, como mariscos e cerveja saborosa em frente de si, quem não se sentiria bem?!

Estava ele no meio de uma frase, decerto cheia de espírito, porquanto a sua companheira ria felicíssima, quando sucedeu qualquer coisa extraordinária: o braço que passava à volta da cintura de Julieta tornou-se pesado como chumbo, enquanto os olhos escuros da rapariga se converteram em círculos giratórios.

Eram rodelas de todas as cores, das mais gritantes às mais apagadas, redopiando vertiginosamente, mais depressa, cada vez mais depressa, até que por fim tudo se converteu num plano escuro.

Este cataclismo foi tão rápido, que a princípio não compreendeu o que se passava. Esboçou até o pensamento duma frase jocosa e quis mudar de posição. Impossível: estava mudo e imóvel.

Com a mesma rapidez que sucedera aquilo, veio-lhe o espanto e uma angústia que o impediam de respirar. Todo o sofrimento existente, desde o princípio ao fim dos séculos, sentiu-o o homem nesse instante.

A mão que procurava a sua trouxe-lhe uma breve acalmia. Os membros tinham-se-lhe alongado e estavam a considerável distância de si, mas mesmo assim apercebeu-se, vagamente, duma pressão e dum deslizar significativo pelos dedos. Compreendeu; e, não fora a sua impotência, estivesse ele de pé, são e escorreito, que seria fulminado por novo ataque de apoplexia.

De si para consigo, comentou:

“Ao menos agora sei quem tu és, e de futuro já não me enganas…”

Da sua ideia ainda não se banira o Futuro, mas, a partir daquele momento, abandonou-se à onda que por ele subia e o mantinha paralizado.

Depois, deu fé que lhe pegavam desajeitadamente – era bastante pesado – e entendeu em surdina a voz dela:

– Depressa, que horror! Tire-o daqui; levem-no para o hospital!

Sem se poder vingar nem reagir, ouviu estas palavras. A rapariga, que lhe jurara um amor eterno, assim o roubava e se desfazia dele como dum objecto incómodo! Mas aquilo não ficaria assim, não…

Para o hospital, ele, um homem tão rico, que levara toda a sua vida a amealhar, e poderia ter os médicos e a assistência que quisesse!

Mas o carro começou a rodar, e Benjamim rodava também dentro de si próprio, passando sem intermitência dos pensamentos mais desconcertantes às paisagens mais estranhas.

 

Era uma planície semeada de pedregulhos, cuja única vegetação consistia numas árvores esquisitas, de braços nus, bordando o extremo do horizonte. Como cor dominante e única, apenas um cinzento carregado, no solo e na atmosfera.

Farrapos de nuvens flutuavam, moviam-se até onde a vista se estendia, e, de vez em quando, umas fitas prateadas ziguezagueavam no ar, aquí e além.

Uma grande bola surgiu, então, aos olhos de Benjamim, com palavras escritas a vermelho rutilante. Fossem quais fossem as voltas que desse, não se ocultavam nem alteravam: “Pecado mortal”.

– Pecado mortal – repetiu estarrecido. E a bola impelida não sabia por quem, talvez pelo vento frio que vinha de longe, batendo-lhe por todos os lados, impedia-o de avançar, obrigava-o a recolher-se e a afundar-se mais em si.

Um coro invisível enchia aquelas paragens desoladoras, tão fortemente, que a princípio lhe era impossível distinguir o significado das vozes. Percebeu depois que eram gritos e imprecações, súplicas e frases de ternura. Tudo, ali, se amassava no coro gigantesco.

 

 

Retiraram-no do automóvel como se fosse um fardo. Ouviu passos e falas à sua volta.

– Sala de observações – disseram.

Sentiu que o deitavam, lhe tocavam e o abandonavam de novo. Ruídos inacostumados prendiam-no ao ponto onde se encontrava. Eram gemidos e gritos vivos, que ele diferençava dos que ouvira há pouco.

Alguém pedia “ar” aflitivamente, e em Benjamim crescia uma revolta surda.

Como tinha vindo parar ali, à mistura com desconhecidos? Ah! Se aquela ladra não lhe tivesse roubado os anéis, ver-se-ia imediatamente que não era pessoa para tolerar uma tal promiscuidade… sabe-se lá com quem, e à qual não se presta atenção.

Habituado a mandar e a agir, no seu cérebro formavam-se planos da desforra de tantos vexames.

Por fim, a ideia nele assente relativa ao seu poder deu em oscilar. Ninguém se importava consigo; o mundo não girava à sua volta. Ele é que era um mundo parado!

Mas, então, não se via logo quem era? Não se metia pelos olhos dentro que era rico e considerado? Por que o não levavam a casa, para a sua bela casa bem decorada? Por que não ouvia os soluços e o pranto da mulher, por ele, ele! estar ali prostrado?!

Em espírito, levantou-se, olhou sobranceiro em derredor e afastou-se, majestosamente, de sobrolho franzido.

Como, porém, não conseguisse senão mover vagamente uma perna naquele curto espaço de tempo, todas as suas opiniões sofreram uma mudança mais radical do que em quarenta anos de existência.

Uma tremura corria-lhe o sangue; e teve medo do escuro e do abandono. Chumbado onde o tinham posto, o pensamento tresvariava; no desespero, a respiração tornou-se-lhe ofegante enquanto o obrigavam a afastar-se de novo.

 

 

Benjamim Trovisco deixara de ouvir os lamentos a seu lado e começava a caminar na campina cinzenta. Mas então, por todos os lados, havia milhares de olhos que nele se fixavam, daqueles olhos parados, meio gelatinosos, das pessoas e dos animais mortos, que sempre lhe haviam causado uma repugnância invencível.

Com a sua voz emudecida, gritava:

– Quem me socorre? Não posso vê-los, não posso…

Queria esconder-se, e não sabia onde; colou-se mesmo ao chão gelado, mas os olhos das pessoas a quem ludibriara perseguiam-no continuamente.

Reconheceu a viúva que defraudara e o homem cuja casa acabada de edificar ele mandara cortar ao meio como se fora um trapo.

“Impostor! – dizia a mulher. – Podes enganar o mundo, mas não enganarás a Deus…”

“E a minha casa? Tinha sido construída com tanto amor… Tudo por um palmo de chão… Mas agora terás tudo o que pretenderes. Esta terra não falta a ninguém”.

Benjamim Trovisco ainda tentou argumentar:

“Mas a lei era a meu favor…”

“Então agora invoca-a…”

“Mas eu estou disposto a restituir…”

Cada vez o ambiente se entenebrecia mais. As faíscas que riscavam o ar eram inúmeras, e entonteciam-no. Os gritos e os clamores, provindo das entranhas do solo, envolviam-no arrepiantes.

Queria andar, mas só conseguia tropeçar e ferir-se nas pedras; buscava ocultar-se, mas todos os clarões pareciam dispostos de forma a incidir nele tornando-o alvo daqueles olhos. O vento zunia com mais força, fustigando-o como cordas, até o cegar.

Benjamim nunca fora destemido; esperto e ambicioso, mas facilmente assustadiço, tremia como uma folha.

Ali, ninguém se dobrava perante ele; e o seu dinheiro não tinha valor algum. Sòzinho e desamparado, de boa vontade daria quanto lhe pedissem. Sem poder avançar nem recuar, sentou-se numa pedra com a cabeça entre as mãos, arrependido e choroso como qualquer criança. Cruelmente flagelado por todos os lados, tinha as roupas rasgadas e o corpo numa chaga.

Sem saber como, transportou-se ao passado.

Naquele outono frequentava a escola pela primeira vez; o irmão mais velho, o Firmino, que fizera a quarta classe em Julho, acompanhara o pai para o campo, demorando-se por lá uma semana infindável.

Amigos como se fossem uma só alma, doeu-lhes a separação, e, depois de tantos dias de ausência, uma grande saudade entrara neles. Por isso o outro, mal chegou, foi esperá-lo impaciente à saída da aula.

– Olá, moço, vem cá!…

Que alegria, Santo Deus! Como costumavam, tal qual dois cachorrinhos brincalhões, ao invés de se abraçarem, começaram a guerrear numa luta fictícia. Por fim, extenuados, deram as mãos e, muito unidos, rindo felizes um para o outro, tomaram o rumo do casal.

O Firmino, que tinha uns grandes olhos ingénuos, morrera há muitos anos; que se ali estivesse defendê-lo-ia de quem quer que fosse.

De repente, olhou e viu o irmão. Não avançou, porém, para guerrearem, e no seu rosto sereno não havia nenhum indício de emoção.

Ele próprio, que primeiro pensara estender-lhe os braços, ficou imóvel. Toda a linguagem e manifestações humanas se lhes traduziam em pensamentos; compreendeu que também o outro se lembrava, ouvira a chamada, e sentia um contentamento igual por se encontrarem.

Estava envergonhado pelo que se passava, mas Firmino, calmo e transparente, como um pedaço de nuvem fina, não lhe fez a menor admoestação. Limitou-se a encobri-lo dos olhos que o espiavam e a acompanhá-lo naquela viagem onde parecia não avançarem, não obstante o cansaço que o invadia e a noção duma corrida veloz.

Também entre o Firmino e os outros parecia haver qualquer acordo, porque, à medida que prosseguiam, atormentavam-no menos.

Como ficara para trás, pela muita dificuldade em seguir no mesmo ritmo de andar, pôde, sem ser notado, encher os bolsos de moedas tiradas de montes que só então divisara à beira do caminho. Reparou nessa ocasião que as pessoas vindas após eles – e eram muitas – homens e mulheres, faziam outro tanto. Novos e velhos, mendigos e gente bem trajada, nenhum conseguia passar insensível à tentação.

Verificou, porém, que o peso ainda lhe dificultava mais a marcha e percebeu a desaprovação do Firmino, a pesar do seu aspecto plácido, de água tranquila.

“Deita isso fora… não servem nem para brincar…”

 

Fosse do peso que sentia nos bolsos, fosse porque, na realidade, já transpusera uma grande distância, teve enorme dificuldade em voltar, quando o corpo se doeu dos mil tratos que lhe faziam. Em seguida sentiu una espécie de chuva sobre o rosto e uma voz familiar que lhe chamava os nomes mais ternos.

– Pelo amor de Deus, o meu marido, aquí, não! Quero um quarto particular, médicos, enfermeiros, enfim, toda a assistência precisa. Não mo deixem morrer! Não temos necessidade de que lhe falte seja o que for! Que os pobres tenham de sujeitar-se, vá… Não poderei levá-lo para nossa casa? Lá, ao menos, terá todo o conforto…

No espírito de Benjamim os factos tinham-se invertido. Era a habitação de pesados reposteiros e tapetes caros que se distanciava. O escritório, de móveis antigos, diligentemente procurados, já nem existia, ao passo que, presentes, estavam apenas o seu remorso a a dificuldade em que se vira, da qual só o irmão o livrara.

Em todo o caso gostaria de contar à mulher o que se passara (em parte, é claro) e corresponder à aflição dela, mas não pôde. Por mais que procurasse transmitir-lhe os seus pensamentos, não o entendia. Percebeu, desolado, que entre eles não havia meio algum de ligação. Os vivos não o podiam compreender, quando os seus braços e a sua fala estavam mortos.

Picaram-no, rodaram-no de novo, e Benjamim teve que dispender uma energia sobre-humana para estar presente a estas cenas.

Ao longe, o Firmino, com o seu corpo suspenso e transparente, esperava-o, com os grandes olhos claros e ingénuos a brilharem intensamente na paisagem triste.

 

 

Desta vez partiu quase confiado. Para o alcançar mais depressa lançou fora algumas moedas. Mesmo assim tinha dificuldade em se mover, e o coro das vozes bárbaras ainda o perseguiu, até o irmão lhe voltar a servir de escudo e de guia, não sabia para onde.

Continuar era, porém, uma ordem imperiosa que, com os pés arrastando-se ainda sobre aquela terra, sem a leveza do outro, se via obrigado a cumprir.

Olhando fixamente na sua frente, observou que o trajo das criaturas que os antecediam ou por eles passavam mais rápidas se esbatiam na atmosfera. Como o medo já lhe não tolhia o raciocínio, notou certos pormenores que lhe tinham passado despercebidos.

Quase sempre eram os pobres quem mais depressa adquiriam aquele vestuário, meio nuvem, meio arminho, enquanto outros chegavam a mostrar um aspecto burlesco.

Havia os que às primeiras passadas, de tão pesados, se sumiam na planura cinzenta e os que se agarravam desesperadamente a um simples objecto ou ideia com que se revestiam. Impossibilitados de andar, arrastavam-se vagarosos e curvados, teimando, apesar de tudo, em levar as insígnias da sua grandeza e a lembrança do mundo. Muitos acabavam por criar raízes e converter-se em árvores. No entanto, bastaria arremessá-los fora, para se libertarem; mas preferiam as penas sem princípio nem fim.

Ao acaso, Benjamim lia-lhes um ou outro pensamento:

“Esta joia que me custou tão cara!”

“E o meu uniforme!”

“E as minhas condecorações!”

“E os meus versos!”

“E a fórmula que inventei!”

“Se aquela ladra não me tem roubado os anéis não ia como um pedinte…”, murmurou para consigo Benjamim.

“Para quê?”, murmurou Firmino. “Queres ainda voltar para trás, ou demorares-te eternamente no caminho? Com essa carga ninguém pode avançar”.

Benjamim sempre aceitara a autoridade daquele irmão mais velho. Teve um leve suspiro e continuou, apertando as moedas que ainda lhe restavam no bolso.

As mulheres eram as mais renitentes em abandonar as suas vaidades terrenas. Cabeceavam à beira do caminho, entre rendas e plumas, com ar de múmias milenárias; Benjamim olhava-as de soslaio, dorido ainda pela sua recente aventura.

Só as mais pobres, as que nada tinham a perder, as crianças e as moças, menos presas a etiquetas e a ceremonial, deslizavam serenas e imponderáveis, já então transformadas naqueles seres libertos.

O Firmino fez-lhe também observar que, sobretudo de princípio, se formam núcleos consoantes as gerarquias, como sucede por toda a parte, nas vilas e nas cidades.

“Mas aquí sabe-se quem são os bons e os maus…”

Benjamim baixou a cabeça envergonhado e repeso.

“Só depois de se vestirem igualmente, e de falarem a fala do pensamento, se misturam. Vês? Chegam primeiro ao fim de todas as canseiras aqueles que nada os prendia à terra…”

Os pés de Benjamim estavam em sangue. Sòzinho, teria desistido, e deixar-se-ia ficar. Não queria, porém, separar-se do irmão e, pouco a pouco, foi-se despojando das moedas que guardava, conseguindo que o seu peso diminuisse consideràvelmente.

Atrás deles vinha gente vagarosa, fazendo sulcos profundos no solo; todos, porém, muito hirtos e compostos. Às vezes, levavam tempos infinitos a transpor uma daquelas pedras, pesados e lentos, como quem cumpre uma maldição.

Mão Toda Poderosa apagara da memória de Benjamim os últimos anos da sua vida. Guiado pelo Firmino, sofria-lhe a influência e voltava a ser o moço que ele ia esperar à saída da escola. Ao contacto da pureza do outro, invadia-o uma grande compaixão por todos.

“Coitados! Talvez pudéssemos ajudá-los…”

“Impossível… Impossível!… Cada um tem de sofrer o peso das suas culpas até que, por si só, se alivie delas. Os que além ficam, pela soberba e vaidade – seja qual for a sua causa, são dos piores males, porque as criaturas arrependem-se de todos os pecados, excepto desses – continuarão presos aos da sua igualha pelos séculos dos séculos…”

“E eu?”, perguntou Benjamim humilde-mente.

“Salvo se alguém, a quem tenham querido com verdadeiro amor, os venha buscar e os ensine a transpor a passagem mais difícil…”

Agora parecia a Benjamim que se elevava duma maneira quase imperceptível.

“É melhor continuarmos”, disse.

E uma curiosidade invencível impelia-o na esteira do irmão.

O coro das vozes, que a princípio o tinha afligido, tornava-se indistinto. Agora, era apenas uma música vaga que, ora se elevava ora diminuía, como o som distante dum órgão numa igreja, perdendo todo o sabor a desespero e angústia.

Sentiu que o moviam, sacudiam e picavam. O caminho era muito difícil de transpor, mas voltou ainda.

“Tantos anos de trabalho honesto para nem sequer gozar a vida! Tão rico, tão novo ainda, não pode morrer! E, para mais, longe de sua casa…” A mulher chorava, passando-lhe um braço à volta do tronco.

Benjamim tardou em compreender esta linguagem. Os seus olhos doutro mundo estavam dilatados com a incoerência do que ouvia. Depois teve um vislumbre de pena dela, dos seus anéis, de toda a sua comodidade de homem rico. Fez um movimento para ficar, tão rápido como uma daquelas faíscas que ziguezagueavam no espaço.

Percebeu que já não podia voltar para trás.

“Para quê?”, perguntou a si próprio.

“Para quê?”, dizia o irmão. “Hoje ou amanhã tinha que acontecer…”

Lá longe, no horizonte, onde a atmosfera cinzenta da morte começava a tingir-se de rosado, o Firmino parara à espera dele com os grandes olhos claros brilhantes como estrelas, e o mesmo rosto precocemente grave, com que acompanhava o pai.

Aquele bloco insensível que repousava sobre a cama começou a arrefecer.

– Morreu! – disse uma voz.

Benjamim Trovisco não ouviu esta palavra ou, se a ouviu, não a entendeu. Lançara fora a última moeda, que num derradeiro apego às coisas do mundo, conservara no bolso, e afastava-se muito leve sobre a planície cinzenta.

Las estrellas habitan lejos

Versión 2015

Texto original y versión española publicados
con la autorización de los herederos de la autora.

 

La muerte de Benjamim Trovisco

Bastaba con mirarlo rápidamente para darse cuenta de que era una criatura bien situada en la vida. Al llegar a los cuarenta años, después de una lucha ardua e ininterrumpida por la conquista de su posición, todo en él denunciaba síntomas inequívocos de abundancia, desde la cabeza echada hacia atrás, hasta el vientre prominente y los anillos que despedían magnéticos resplandores en sus dedos.

Estas y otras características hacían de Benjamim Trovisco (el apellido denotaba su origen humilde: hijo de Ambrósio de la familia Trovisco) una persona muy estimada y reputada.

Debilidad, si debilidad puede llamársele a ese contentamiento suyo, solo se le conocía la de una acentuada predilección por el bello sexo, con el cual era extremadamente liberal. Hasta es posible que esta apreciación sea absolutamente contraria a las intenciones que lo movían. En el fondo, no sería sino un bienhechor que procuraba reparar de algún modo pequeñas bagatelas, leves pecadillos de conciencia que ocurrieron en el tiempo en que había comenzado su vida de negocios… La incomprensible pobreza de una viuda, de quien había sido administrador, y otras insignificancias sui generis

Su honestidad, ahora absoluta, había aumentado en proporción a su capital; y que esos pormenores no tenían importancia, se reconocía plenamente en su expresión beatífica, ingenua y alegre.

Benjamim Trovisco había venido a la ciudad y había decidido emplear el tiempo que le restaba de una lucrativa especulación, de la forma más agradable e inocente, con una vieja conocida.

El lugar, un restaurante de los alrededores, era propicio. Debajo de aquel cenador cubierto por una trepadora florida, con mariscos y cerveza deliciosa ante él, ¿quién no se sentiría bien?

Estaba en medio de una frase, ciertamente llena de ingenio, visto que su compañera se reía felicísima, cuando sucedió una cosa extraordinaria: el brazo que pasaba alrededor de la cintura de Julieta se volvió tan pesado como el plomo, mientras los ojos oscuros de la muchacha se habían convertido en círculos giratorios.

Eran aros de todos los colores, desde los más chillones a los más apagados, que daban vueltas vertiginosamente, más deprisa, cada vez más deprisa, hasta que por fin todo se convirtió en un plano oscuro.

Este cataclismo fue tan rápido, que al principio no comprendió lo que pasaba. Esbozó incluso el pensamiento de una frase jocosa y quiso cambiar de posición. Imposible: estaba mudo e inmóvil.

Con la misma rapidez con que le había sucedido aquello, le vino el miedo y una angustia que le impedía respirar. Todo el sufrimiento existente, desde el principio hasta el fin de los siglos, lo sintió el hombre durante ese instante.

La mano que buscaba la suya le trajo una breve calma. Los miembros se le habían alargado y estaban a considerable distancia de él, pero incluso así se dio cuenta, vagamente, de una presión y de un deslizamiento significativo en sus dedos. Comprendió; y, si no fuera por su impotencia, si estuviera de pie, sano y perfecto, sería fulminado por un nuevo ataque de apoplejía.

Para sí mismo comentó:

“Al menos ahora sé quien eres, y en el futuro ya no me engañas…”

De su mente aún no había sido desterrado el Futuro, pero, a partir de ese momento, se abandonó a la ola que subía por él y que lo mantenía paralizado.

Después, dio fe de que lo cogían torpemente – era bastante pesado – y oyó en sordina la voz de ella:

– ¡Deprisa, qué horror! ¡Quítelo de aquí, y llévenlo al hospital!

Sin poder vengarse ni reaccionar, oyó estas palabras. La muchacha, que le había jurado un amor eterno, ¡así le robaba y se deshacía de él como de un objeto incómodo! Pero aquello no se quedaría así, no…

¡Al hospital, él, un hombre tan rico, que se había llevado toda la vida ahorrando, y podría tener todos los médicos y la asistencia que quisiera!

Pero el coche empezó a rodar, y Benjamim rodaba también dentro de él mismo, pasando sin intermitencia de los pensamientos más desconcertantes a los paisajes más extraños.

 

Era una llanura sembrada de pedruscos, cuya única vegetación consistía en unos árboles extraños, de ramas desnudas, que bordaban el final del horizonte. Como color dominante y único, solo un gris fuerte, en el suelo y en la atmósfera.

Harapos de nubes flotaban, se movían hasta donde la vista se extendía, y de vez en cuando, unas cintas plateadas zigzagueaban en el aire, aquí y allí.

Una gran esfera surgió, entonces, ante los ojos de Benjamim, con palabras escritas en rojo rutilante. Diera las vueltas que diera, no se ocultaban ni alteraban: “Pecado mortal”.

– Pecado mortal – repitió horrorizado. Y la esfera, empujada no sabía por quién, tal vez por el viento frío que llegaba de lejos, golpeándole por todos lados, le impedía avanzar, lo obligaba a recogerse y a hundirse más en sí mismo.

Un coro invisible llenaba aquellos parajes desoladores, tan fuertemente, que al principio le resultaba imposible distinguir el significado de las voces. Se dio cuenta, después, de que eran gritos e imprecaciones, súplicas y frases de ternura. Todo, allí, se unía en un coro gigantesco.

 

Lo sacaron del automóvil como si fuera una carga. Oyó pasos y frases a su alrededor.

– Sala de observaciones – dijeron.

Sintió que lo tendían, que lo tocaban y lo abandonaban de nuevo. Ruidos insólitos lo sujetaban al punto donde se encontraba. Eran gemidos y gritos vivos que él diferenciaba de los que había oído hacía poco.

Alguien pedía “aire” con aflicción, y en Benjamim crecía una sublevación sorda.

¿Cómo había llegado a parar allí, confundido con desconocidos? ¡Ah! Si aquella ladrona no le hubiera robado los anillos, se vería de inmediato que él no era una persona que tolerara tal promiscuidad… bien se sabe con quién y a quién no se presta atención.

Acostumbrado a mandar y a actuar, en su cerebro se formaban planes para desquitarse de tantas vejaciones.

Por fin, su idea fija, relativa a su poder, comenzó a vacilar. Él no le importaba a nadie; el mundo no giraba a su alrededor. ¡Él sí que era un mundo detenido!

Pero ¿acaso no se veía enseguida quién era? ¿No saltaba a los ojos que era rico y reputado? ¿Por qué no lo llevaban a casa, a su hermosa casa bien decorada? ¿Por qué no oía los sollozos y el llanto de su mujer, por él, él, que estaba allí postrado?

Su espíritu se levantó, miró altivo a su alrededor y se alejó, majestuosamente, con el ceño fruncido.

Sin embargo, visto que solo conseguía mover vagamente una pierna, en ese corto espacio de tiempo, todas sus opiniones sufrieron un cambio más radical que en sus cuarenta años de existencia.

Un temblor le recorría la sangre; y tuvo miedo de la oscuridad y del abandono. Adherido al lugar donde lo habían puesto, el pensamiento desvariaba; en la desesperación, la respiración se le volvió jadeante mientras lo obligaban a alejarse de nuevo.

 

Benjamim Trovisco había dejado de oír los lamentos a su lado, y comenzaba a caminar por un campo gris. Pero entonces, por todos lados, había millares de ojos que se fijaban en él, esos ojos detenidos, medio gelatinosos, de las personas y de los animales muertos, que siempre le habían causado una repugnancia invencible.

Con su voz enmudecida, gritaba:

– ¿Quién me socorre? No puedo verlos, no puedo…

Quería esconderse, y no sabía dónde; se pegó incluso al suelo helado, pero los ojos de las personas a quienes había escarnecido lo perseguían continuamente.

Reconoció a la viuda a la que había defraudado y al hombre cuya casa, acabada de construir, él había mandado quitar de en medio como si fuera un trapo.

“¡Impostor! – decía la mujer. – Puedes engañar al mundo, pero no engañarás a Dios… “

“¿Y mi casa? Había sido construida con tanto amor… Todo por un palmo de suelo… Pero ahora tendrás todo lo que pretendas. Esta tierra no le falta a nadie.”

Benjamim Trovisco aún intentó argumentar:

“Pero la ley estaba de mi parte…”

“Entonces, invócala ahora…”

“Pero estoy dispuesto a devolverte…”

El ambiente se ennegrecía cada vez más. Las centellas que surcaban el aire eran innumerables, y lo atontaban. Los gritos y los clamores, que provenían de las entrañas de la tierra, lo envolvían en su terror.

Quería caminar, pero solo conseguía tropezar y herirse con las piedras; procuraba ocultarse, pero todos los resplandores parecían dispuestos como para incidir en él y convertirlo en el blanco de esos ojos. El viento zumbaba con más fuerza, fustigándolo como cuerdas, hasta cegarlo.

Benjamim nunca había sido intrépido; experto y ambicioso, pero fácilmente asustadizo, temblaba como una hoja.

Allí, nadie se doblaba ante él; y su dinero no tenía valor alguno. Solo y desamparado, de buena voluntad hubiera dado cuanto le pidieran. Sin poder avanzar ni retroceder, se sentó en una piedra con la cabeza entre las manos, arrepentido y lloroso como un niño. Cruelmente flagelado por todos lados, tenía las ropas rasgadas y el cuerpo hecho una llaga.

Sin saber cómo, se trasladó al pasado.

Aquel otoño asistía a la escuela por primera vez; el hermano mayor, Firmino, que había terminado cuarto en julio, había acompañado al padre al campo, y se había quedado allí una semana interminable.

Amigos como si fueran una sola alma, les dolió la separación, y, después de tantos días de ausencia, una gran nostalgia los había invadido. Por eso, el otro, apenas llegó, fue a esperarlo impaciente a la salida de la clase.

– ¡Hola, mozo, ven acá!…

¡Qué alegría, Dios Santo! Tal como solían, iguales a dos cachorritos juguetones, en lugar de abrazarse, comenzaron a guerrear en una lucha ficticia. Por fin, extenuados, se dieron las manos y, muy unidos, riendo felices, el uno para el otro, pusieron rumbo a casa.

Firmino, que tenía unos grandes ojos ingenuos, había muerto hacía muchos años; porque si estuviera allí, lo defendería de quienquiera que fuera.

De repente, miró y vio a su hermano. No avanzó, sin embargo, para guerrear, y en su rostro sereno no había ningún indicio de emoción.

Él mismo, que antes había pensado extenderle los brazos, se quedó inmóvil. Todo el lenguaje y las manifestaciones humanas se le traducían en pensamientos; comprendió que también el otro se acordaba, había oído su llamada, y sentía un gozo igual al encontrarse con él.

Estaba avergonzado por lo que pasaba, pero Firmino, tranquilo y transparente, como un pedazo de nube fina, no le hizo la menor amonestación. Se limitó a esconderlo de los ojos que lo espiaban y a acompañarlo en ese viaje donde parecía que no avanzaban, a pesar del cansancio que lo invadía y de la sensación de una carrera veloz.

También entre Firmino y los otros parecía que había un acuerdo, porque, a medida que avanzaban, lo atormentaban menos.

Como se había quedado detrás, debido a la dificultad para seguir el mismo ritmo al caminar, pudo, sin que lo notaran, llenarse los bolsillos de monedas extraídas de montes que solo entonces había divisado junto al camino. Reparó en esa ocasión en que las personas que venían tras él, – y eran muchas – hombres y mujeres, hacían lo mismo. Jóvenes y viejos, mendigos y gente bien trajeada, nadie conseguía pasar insensible a la tentación.

Comprobó, sin embargo, que el peso aún le dificultaba más la marcha y se dio cuenta de la desaprobación de Firmino, a pesar de su aspecto plácido, de agua serena.

“Tira eso… no sirven ni para jugar…”

 

Bien fuera por el peso que sentía en los bolsillos, bien fuera porque, en realidad, ya había recorrido una gran distancia, tuvo enorme dificultad para volver, cuando al cuerpo le dolieron los mil tormentos que le causaban. Enseguida, sintió una especie de lluvia sobre el rostro y una voz familiar que le decía los nombres más tiernos.

– ¡Por el amor de Dios, mi marido, aquí, no! Quiero una habitación individual, médicos, enfermeros, en fin, todo el cuidado necesario. ¡No dejen que se me muera! ¡No tenemos necesidad de que le falte nada! Que los pobres tengan que someterse, vale… ¿No podré llevármelo a casa? Allí, por lo menos, tendrá todas las comodidades…

En el alma de Benjamim los hechos se habían invertido. Era la habitación de pesadas cortinas y alfombras lo que se alejaba. El escritorio, de muebles antiguos, diligentemente buscados, ya ni existía, al paso que, presentes, solo estaban su remordimiento y la dificultad en que se había visto, de la que solo el hermano lo había liberado.

En todo caso, le gustaría contarle a la mujer lo que había pasado (en parte, es obvio) y corresponder a su aflicción, pero no pudo. Por más que intentara transmitirle sus pensamientos, ella no lo entendía. Se dio cuenta, desolado, de que entre ellos no había medio alguno para relacionarse. Los vivos no podían comprenderlo, cuando sus brazos y su habla estaban muertos.

Lo pincharon, lo volvieron de nuevo, y Benjamim tuvo que gastar una energía sobrehumana para estar presente en estas escenas.

A lo lejos, Firmino, con su cuerpo suspendido y transparente, lo esperaba, con sus grandes ojos claros e ingenuos brillando intensamente en el paisaje triste.

 

Esta vez partió casi confiado. Para alcanzarlo más deprisa lanzó fuera algunas monedas. Incuso así tenía dificultades para moverse, y el coro de las voces bárbaras aún lo persiguió, hasta que el hermano volvió a servirle de escudo y de guía, no sabía para dónde.

Continuar era, sin embargo, una orden imperiosa que, con los pies arrastrándose aún sobre esa tierra, sin la levedad del otro, se veía obligado a cumplir.

Mirando fijamente a su frente, observó que el traje de las criaturas que les precedían o que pasaban a su lado más rápidas se atenuaba en la atmósfera. Como el miedo ya no le quitaba el raciocinio, notó ciertos pormenores que le habían pasado desapercibidos.

Casi siempre eran los pobres quienes más deprisa adquirían ese vestuario, medio nube, medio armiño, mientras los otros llegaban a mostrar un aspecto burlesco.

Estaban los que en los primeros pasos, de tan pesados, se sumían en la llanura gris y quienes se agarraban desesperadamente a un simple objeto o idea con que se revestían. Imposibilitados para caminar, se arrastraban lentos y encorvados, porfiando, a pesar de todo, por llevar las insignias de su grandeza y el recuerdo del mundo. Muchos acababan por echar raíces y convertirse en árboles. Sin embargo, habría bastado con arrancarse para liberarse; pero preferían las penas sin principio ni fin.

Al azar, Benjamim les leía un pensamiento u otro:

“¡Esta joya que me costó tan cara!”

“¡Y mi uniforme!”

“¡Y mis condecoraciones!”

“¡Y mis versos!”

“¡Y la fórmula que inventé!”

“Si aquella ladrona no me hubiera robado los anillos, no iría como un pordiosero…”, murmuró para sí mismo Benjamim.

“¿Para qué?”, murmuró Firmino. “¿Quieres aún volver atrás, o pararte eternamente en el camino? Con esa carga nadie puede avanzar.”

Benjamim siempre había aceptado la autoridad de ese hermano mayor. Tuvo un leve suspiro y continuó, apretando las monedas que aún le quedaban en el bolsillo.

Las mujeres eran las más reacias a abandonar sus vanidades terrenas. Cabeceaban junto al camino, entre encajes y plumas, con aire de momias milenarias; Benjamim las miraba de soslayo, lastimado aún por su reciente aventura.

Solo las más pobres, las que nada tenían que perder, las niñas y las jóvenes, menos sometidas a etiquetas y ceremonias, se deslizaban serenas e imponderables, ya entonces transformadas en esos seres liberados.

Firmino le hizo observar también que, sobre todo al principio, se forman núcleos de acuerdo con las jerarquías, como sucede por todos lados, en los pueblos y en las ciudades.

“Pero aquí se sabe quiénes son los buenos y los malos…”

Benjamim bajó la cabeza, avergonzado y arrepentido.

“Solo después de que se vistan igual y de que hablen el habla del pensamiento, se unen. ¿Ves? Llegan antes al final de todas las fatigas aquellos a los que nada los sujetaba a la tierra…”

Los pies de Benjamim estaban sangrientos. Solo, habría desistido, y se habría abandonado. No quería, sin embargo, separarse del hermano y, poco a poco, se fue despojando de las monedas que guardaba, consiguiendo que su peso disminuyera considerablemente.

Detrás de ellos venía gente pausada, haciendo surcos profundos en el suelo; todos, sin embargo, muy erguidos y compuestos. A veces, empleaban tiempos infinitos para superar una de aquellas piedras, pesados y lentos, como quien cumple una maldición.

Mano Todo Poderosa había borrado de la memoria de Benjamim los últimos años de su vida. Guiado por Firmino, sentía su influencia y volvía a ser el mozo al que él iba a esperar a la salida de la escuela. Al contacto con la pureza del otro, lo invadía una gran compasión por todos.

“¡Infelices! Tal vez podamos ayudarlos…”

“¡Imposible… Imposible!… cada uno tiene que sufrir el peso de sus culpas hasta que, por sí solo, se alivie de ellas. Los que se quedan al otro lado, por soberbia y vanidad – sea cual sea su causa, son los peores males, porque las criaturas se arrepienten de todos los pecados, excepto de esos -, continuarán sujetos a los de su condición por los siglos de los siglos…”

“¿Y yo?”, preguntó Benjamim humildemente.

“Salvo si alguien, a quien hayan querido con verdadero amor, viene a buscarlos y les enseña a superar el tramo más difícil…”

Ahora le parecía a Benjamim que se elevaba de una manera casi imperceptible.

“Es mejor que continuemos”, dijo.

Y una curiosidad invencible lo empujaba hacia la estela del hermano.

El coro de voces, que al principio lo había afligido, se volvía impreciso. Ahora, solo era una música vaga que ya se elevaba ya disminuía, como el sonido lejano de un órgano en una iglesia, perdiendo todo el sabor a desesperación y angustia.

Sintió que lo movían, lo sacudían y lo pinchaban. El camino era muy difícil de superar, pero volvió de nuevo.

“¡Tantos años de trabajo honesto para ni siquiera gozar la vida! ¡Tan rico, tan joven aún, no puede morir! Y, además, lejos de su casa…” La mujer lloraba, pasándole un brazo alrededor del tronco.

Benjamim tardó en comprender este lenguaje. Sus ojos de otro mundo estaban dilatados con la incoherencia de lo que oía. Después tuvo un atisbo de pena por ella, por sus anillos, por toda su comodidad de hombre rico. Hizo un movimiento como para quedarse, tan rápido como una de aquellas centellas que zigzagueaban por el espacio.

Se dio cuenta de que ya no podía volver atrás.

«¿Para qué?», se preguntó a sí mismo.

“¿Para qué?”, decía el hermano. “Hoy o mañana tenía que suceder…”

Allá lejos, en el horizonte, donde la atmósfera gris de la muerte comenzaba a teñirse de rosa, Firmino se había detenido para esperarlo con sus grandes ojos claros y brillantes como estrellas, y el mismo rostro precozmente grave con que acompañaba al padre.

Aquel bloque insensible que descansaba sobre la cama comenzó a enfriarse.

– ¡Murió! – dijo una voz.

Benjamim Trovisco no oyó esta palabra o, si la oyó, no la entendió. Había tirado la última moneda, que en un último apego a las cosas del mundo había guardado en el bolsillo, y se alejaba muy leve sobre la llanura gris.

©Todos los derechos reservados. Desarrollado por Centro Informático Millenium