As estrelas moram longe
1946
A morte de Benjamim Trovisco
Bastava olhá-lo de relance para se perceber que era uma criatura bem instalada na vida. Ao chegar aos quarenta anos, depois duma luta árdua e ininterrupta pela conquista do seu lugar, todo ele denunciava sintomas inequívocos de abastança, desde a cabeça inclinada para trás, ao ventre proeminente e aos anéis que chispavam magnéticos clarões nos seus dedos.
Estas e outras qualidades faziam de Benjamim Trovisco (o apelido denotava a sua origem humilde: filho de Ambrósio do casal do Trovisco) pessoa largamente estimada e conceituada.
Fraco, se fraco se pode chamar a esse seu aprazimento, conhecia-se-lhe apenas o de uma acentuada predilecção pelo belo sexo, com o qual era extremamente liberal. É possível até que esta apreciação seja absolutamente contrária aos intuitos que o moviam. No fundo, não seria mais que um benemérito a procurar reparar de alguma maneira pequenas bagatelas, leves pecadilhos de consciência ocorridos no tempo em que começara a sua vida de negócios… A incompreensível pobreza duma viúva, cujo procurador fora, e outras insignificâncias sui generis…
A sua honestidade, agora absoluta, aumentara-lhe proporcionalmente aos cabedais; e que esses pormenores não tinham importância, reconhecia-se plenamente na sua expressão beatífica, ingénua e alegre.
Benjamim Trovisco viera à cidade e resolvera empregar o tempo que lhe sobrava duma lucrativa especulação, da forma mais agradável e inocente, com um velho conhecimento.
O local, um restaurante dos arredores, era propício. Debaixo daquele caramanchão coberto por uma trepadeira florida, como mariscos e cerveja saborosa em frente de si, quem não se sentiria bem?!
Estava ele no meio de uma frase, decerto cheia de espírito, porquanto a sua companheira ria felicíssima, quando sucedeu qualquer coisa extraordinária: o braço que passava à volta da cintura de Julieta tornou-se pesado como chumbo, enquanto os olhos escuros da rapariga se converteram em círculos giratórios.
Eram rodelas de todas as cores, das mais gritantes às mais apagadas, redopiando vertiginosamente, mais depressa, cada vez mais depressa, até que por fim tudo se converteu num plano escuro.
Este cataclismo foi tão rápido, que a princípio não compreendeu o que se passava. Esboçou até o pensamento duma frase jocosa e quis mudar de posição. Impossível: estava mudo e imóvel.
Com a mesma rapidez que sucedera aquilo, veio-lhe o espanto e uma angústia que o impediam de respirar. Todo o sofrimento existente, desde o princípio ao fim dos séculos, sentiu-o o homem nesse instante.
A mão que procurava a sua trouxe-lhe uma breve acalmia. Os membros tinham-se-lhe alongado e estavam a considerável distância de si, mas mesmo assim apercebeu-se, vagamente, duma pressão e dum deslizar significativo pelos dedos. Compreendeu; e, não fora a sua impotência, estivesse ele de pé, são e escorreito, que seria fulminado por novo ataque de apoplexia.
De si para consigo, comentou:
“Ao menos agora sei quem tu és, e de futuro já não me enganas…”
Da sua ideia ainda não se banira o Futuro, mas, a partir daquele momento, abandonou-se à onda que por ele subia e o mantinha paralizado.
Depois, deu fé que lhe pegavam desajeitadamente – era bastante pesado – e entendeu em surdina a voz dela:
– Depressa, que horror! Tire-o daqui; levem-no para o hospital!
Sem se poder vingar nem reagir, ouviu estas palavras. A rapariga, que lhe jurara um amor eterno, assim o roubava e se desfazia dele como dum objecto incómodo! Mas aquilo não ficaria assim, não…
Para o hospital, ele, um homem tão rico, que levara toda a sua vida a amealhar, e poderia ter os médicos e a assistência que quisesse!
Mas o carro começou a rodar, e Benjamim rodava também dentro de si próprio, passando sem intermitência dos pensamentos mais desconcertantes às paisagens mais estranhas.
Era uma planície semeada de pedregulhos, cuja única vegetação consistia numas árvores esquisitas, de braços nus, bordando o extremo do horizonte. Como cor dominante e única, apenas um cinzento carregado, no solo e na atmosfera.
Farrapos de nuvens flutuavam, moviam-se até onde a vista se estendia, e, de vez em quando, umas fitas prateadas ziguezagueavam no ar, aquí e além.
Uma grande bola surgiu, então, aos olhos de Benjamim, com palavras escritas a vermelho rutilante. Fossem quais fossem as voltas que desse, não se ocultavam nem alteravam: “Pecado mortal”.
– Pecado mortal – repetiu estarrecido. E a bola impelida não sabia por quem, talvez pelo vento frio que vinha de longe, batendo-lhe por todos os lados, impedia-o de avançar, obrigava-o a recolher-se e a afundar-se mais em si.
Um coro invisível enchia aquelas paragens desoladoras, tão fortemente, que a princípio lhe era impossível distinguir o significado das vozes. Percebeu depois que eram gritos e imprecações, súplicas e frases de ternura. Tudo, ali, se amassava no coro gigantesco.
Retiraram-no do automóvel como se fosse um fardo. Ouviu passos e falas à sua volta.
– Sala de observações – disseram.
Sentiu que o deitavam, lhe tocavam e o abandonavam de novo. Ruídos inacostumados prendiam-no ao ponto onde se encontrava. Eram gemidos e gritos vivos, que ele diferençava dos que ouvira há pouco.
Alguém pedia “ar” aflitivamente, e em Benjamim crescia uma revolta surda.
Como tinha vindo parar ali, à mistura com desconhecidos? Ah! Se aquela ladra não lhe tivesse roubado os anéis, ver-se-ia imediatamente que não era pessoa para tolerar uma tal promiscuidade… sabe-se lá com quem, e à qual não se presta atenção.
Habituado a mandar e a agir, no seu cérebro formavam-se planos da desforra de tantos vexames.
Por fim, a ideia nele assente relativa ao seu poder deu em oscilar. Ninguém se importava consigo; o mundo não girava à sua volta. Ele é que era um mundo parado!
Mas, então, não se via logo quem era? Não se metia pelos olhos dentro que era rico e considerado? Por que o não levavam a casa, para a sua bela casa bem decorada? Por que não ouvia os soluços e o pranto da mulher, por ele, ele! estar ali prostrado?!
Em espírito, levantou-se, olhou sobranceiro em derredor e afastou-se, majestosamente, de sobrolho franzido.
Como, porém, não conseguisse senão mover vagamente uma perna naquele curto espaço de tempo, todas as suas opiniões sofreram uma mudança mais radical do que em quarenta anos de existência.
Uma tremura corria-lhe o sangue; e teve medo do escuro e do abandono. Chumbado onde o tinham posto, o pensamento tresvariava; no desespero, a respiração tornou-se-lhe ofegante enquanto o obrigavam a afastar-se de novo.
Benjamim Trovisco deixara de ouvir os lamentos a seu lado e começava a caminar na campina cinzenta. Mas então, por todos os lados, havia milhares de olhos que nele se fixavam, daqueles olhos parados, meio gelatinosos, das pessoas e dos animais mortos, que sempre lhe haviam causado uma repugnância invencível.
Com a sua voz emudecida, gritava:
– Quem me socorre? Não posso vê-los, não posso…
Queria esconder-se, e não sabia onde; colou-se mesmo ao chão gelado, mas os olhos das pessoas a quem ludibriara perseguiam-no continuamente.
Reconheceu a viúva que defraudara e o homem cuja casa acabada de edificar ele mandara cortar ao meio como se fora um trapo.
“Impostor! – dizia a mulher. – Podes enganar o mundo, mas não enganarás a Deus…”
“E a minha casa? Tinha sido construída com tanto amor… Tudo por um palmo de chão… Mas agora terás tudo o que pretenderes. Esta terra não falta a ninguém”.
Benjamim Trovisco ainda tentou argumentar:
“Mas a lei era a meu favor…”
“Então agora invoca-a…”
“Mas eu estou disposto a restituir…”
Cada vez o ambiente se entenebrecia mais. As faíscas que riscavam o ar eram inúmeras, e entonteciam-no. Os gritos e os clamores, provindo das entranhas do solo, envolviam-no arrepiantes.
Queria andar, mas só conseguia tropeçar e ferir-se nas pedras; buscava ocultar-se, mas todos os clarões pareciam dispostos de forma a incidir nele tornando-o alvo daqueles olhos. O vento zunia com mais força, fustigando-o como cordas, até o cegar.
Benjamim nunca fora destemido; esperto e ambicioso, mas facilmente assustadiço, tremia como uma folha.
Ali, ninguém se dobrava perante ele; e o seu dinheiro não tinha valor algum. Sòzinho e desamparado, de boa vontade daria quanto lhe pedissem. Sem poder avançar nem recuar, sentou-se numa pedra com a cabeça entre as mãos, arrependido e choroso como qualquer criança. Cruelmente flagelado por todos os lados, tinha as roupas rasgadas e o corpo numa chaga.
Sem saber como, transportou-se ao passado.
Naquele outono frequentava a escola pela primeira vez; o irmão mais velho, o Firmino, que fizera a quarta classe em Julho, acompanhara o pai para o campo, demorando-se por lá uma semana infindável.
Amigos como se fossem uma só alma, doeu-lhes a separação, e, depois de tantos dias de ausência, uma grande saudade entrara neles. Por isso o outro, mal chegou, foi esperá-lo impaciente à saída da aula.
– Olá, moço, vem cá!…
Que alegria, Santo Deus! Como costumavam, tal qual dois cachorrinhos brincalhões, ao invés de se abraçarem, começaram a guerrear numa luta fictícia. Por fim, extenuados, deram as mãos e, muito unidos, rindo felizes um para o outro, tomaram o rumo do casal.
O Firmino, que tinha uns grandes olhos ingénuos, morrera há muitos anos; que se ali estivesse defendê-lo-ia de quem quer que fosse.
De repente, olhou e viu o irmão. Não avançou, porém, para guerrearem, e no seu rosto sereno não havia nenhum indício de emoção.
Ele próprio, que primeiro pensara estender-lhe os braços, ficou imóvel. Toda a linguagem e manifestações humanas se lhes traduziam em pensamentos; compreendeu que também o outro se lembrava, ouvira a chamada, e sentia um contentamento igual por se encontrarem.
Estava envergonhado pelo que se passava, mas Firmino, calmo e transparente, como um pedaço de nuvem fina, não lhe fez a menor admoestação. Limitou-se a encobri-lo dos olhos que o espiavam e a acompanhá-lo naquela viagem onde parecia não avançarem, não obstante o cansaço que o invadia e a noção duma corrida veloz.
Também entre o Firmino e os outros parecia haver qualquer acordo, porque, à medida que prosseguiam, atormentavam-no menos.
Como ficara para trás, pela muita dificuldade em seguir no mesmo ritmo de andar, pôde, sem ser notado, encher os bolsos de moedas tiradas de montes que só então divisara à beira do caminho. Reparou nessa ocasião que as pessoas vindas após eles – e eram muitas – homens e mulheres, faziam outro tanto. Novos e velhos, mendigos e gente bem trajada, nenhum conseguia passar insensível à tentação.
Verificou, porém, que o peso ainda lhe dificultava mais a marcha e percebeu a desaprovação do Firmino, a pesar do seu aspecto plácido, de água tranquila.
“Deita isso fora… não servem nem para brincar…”
Fosse do peso que sentia nos bolsos, fosse porque, na realidade, já transpusera uma grande distância, teve enorme dificuldade em voltar, quando o corpo se doeu dos mil tratos que lhe faziam. Em seguida sentiu una espécie de chuva sobre o rosto e uma voz familiar que lhe chamava os nomes mais ternos.
– Pelo amor de Deus, o meu marido, aquí, não! Quero um quarto particular, médicos, enfermeiros, enfim, toda a assistência precisa. Não mo deixem morrer! Não temos necessidade de que lhe falte seja o que for! Que os pobres tenham de sujeitar-se, vá… Não poderei levá-lo para nossa casa? Lá, ao menos, terá todo o conforto…
No espírito de Benjamim os factos tinham-se invertido. Era a habitação de pesados reposteiros e tapetes caros que se distanciava. O escritório, de móveis antigos, diligentemente procurados, já nem existia, ao passo que, presentes, estavam apenas o seu remorso a a dificuldade em que se vira, da qual só o irmão o livrara.
Em todo o caso gostaria de contar à mulher o que se passara (em parte, é claro) e corresponder à aflição dela, mas não pôde. Por mais que procurasse transmitir-lhe os seus pensamentos, não o entendia. Percebeu, desolado, que entre eles não havia meio algum de ligação. Os vivos não o podiam compreender, quando os seus braços e a sua fala estavam mortos.
Picaram-no, rodaram-no de novo, e Benjamim teve que dispender uma energia sobre-humana para estar presente a estas cenas.
Ao longe, o Firmino, com o seu corpo suspenso e transparente, esperava-o, com os grandes olhos claros e ingénuos a brilharem intensamente na paisagem triste.
Desta vez partiu quase confiado. Para o alcançar mais depressa lançou fora algumas moedas. Mesmo assim tinha dificuldade em se mover, e o coro das vozes bárbaras ainda o perseguiu, até o irmão lhe voltar a servir de escudo e de guia, não sabia para onde.
Continuar era, porém, uma ordem imperiosa que, com os pés arrastando-se ainda sobre aquela terra, sem a leveza do outro, se via obrigado a cumprir.
Olhando fixamente na sua frente, observou que o trajo das criaturas que os antecediam ou por eles passavam mais rápidas se esbatiam na atmosfera. Como o medo já lhe não tolhia o raciocínio, notou certos pormenores que lhe tinham passado despercebidos.
Quase sempre eram os pobres quem mais depressa adquiriam aquele vestuário, meio nuvem, meio arminho, enquanto outros chegavam a mostrar um aspecto burlesco.
Havia os que às primeiras passadas, de tão pesados, se sumiam na planura cinzenta e os que se agarravam desesperadamente a um simples objecto ou ideia com que se revestiam. Impossibilitados de andar, arrastavam-se vagarosos e curvados, teimando, apesar de tudo, em levar as insígnias da sua grandeza e a lembrança do mundo. Muitos acabavam por criar raízes e converter-se em árvores. No entanto, bastaria arremessá-los fora, para se libertarem; mas preferiam as penas sem princípio nem fim.
Ao acaso, Benjamim lia-lhes um ou outro pensamento:
“Esta joia que me custou tão cara!”
“E o meu uniforme!”
“E as minhas condecorações!”
“E os meus versos!”
“E a fórmula que inventei!”
“Se aquela ladra não me tem roubado os anéis não ia como um pedinte…”, murmurou para consigo Benjamim.
“Para quê?”, murmurou Firmino. “Queres ainda voltar para trás, ou demorares-te eternamente no caminho? Com essa carga ninguém pode avançar”.
Benjamim sempre aceitara a autoridade daquele irmão mais velho. Teve um leve suspiro e continuou, apertando as moedas que ainda lhe restavam no bolso.
As mulheres eram as mais renitentes em abandonar as suas vaidades terrenas. Cabeceavam à beira do caminho, entre rendas e plumas, com ar de múmias milenárias; Benjamim olhava-as de soslaio, dorido ainda pela sua recente aventura.
Só as mais pobres, as que nada tinham a perder, as crianças e as moças, menos presas a etiquetas e a ceremonial, deslizavam serenas e imponderáveis, já então transformadas naqueles seres libertos.
O Firmino fez-lhe também observar que, sobretudo de princípio, se formam núcleos consoantes as gerarquias, como sucede por toda a parte, nas vilas e nas cidades.
“Mas aquí sabe-se quem são os bons e os maus…”
Benjamim baixou a cabeça envergonhado e repeso.
“Só depois de se vestirem igualmente, e de falarem a fala do pensamento, se misturam. Vês? Chegam primeiro ao fim de todas as canseiras aqueles que nada os prendia à terra…”
Os pés de Benjamim estavam em sangue. Sòzinho, teria desistido, e deixar-se-ia ficar. Não queria, porém, separar-se do irmão e, pouco a pouco, foi-se despojando das moedas que guardava, conseguindo que o seu peso diminuisse consideràvelmente.
Atrás deles vinha gente vagarosa, fazendo sulcos profundos no solo; todos, porém, muito hirtos e compostos. Às vezes, levavam tempos infinitos a transpor uma daquelas pedras, pesados e lentos, como quem cumpre uma maldição.
Mão Toda Poderosa apagara da memória de Benjamim os últimos anos da sua vida. Guiado pelo Firmino, sofria-lhe a influência e voltava a ser o moço que ele ia esperar à saída da escola. Ao contacto da pureza do outro, invadia-o uma grande compaixão por todos.
“Coitados! Talvez pudéssemos ajudá-los…”
“Impossível… Impossível!… Cada um tem de sofrer o peso das suas culpas até que, por si só, se alivie delas. Os que além ficam, pela soberba e vaidade – seja qual for a sua causa, são dos piores males, porque as criaturas arrependem-se de todos os pecados, excepto desses – continuarão presos aos da sua igualha pelos séculos dos séculos…”
“E eu?”, perguntou Benjamim humilde-mente.
“Salvo se alguém, a quem tenham querido com verdadeiro amor, os venha buscar e os ensine a transpor a passagem mais difícil…”
Agora parecia a Benjamim que se elevava duma maneira quase imperceptível.
“É melhor continuarmos”, disse.
E uma curiosidade invencível impelia-o na esteira do irmão.
O coro das vozes, que a princípio o tinha afligido, tornava-se indistinto. Agora, era apenas uma música vaga que, ora se elevava ora diminuía, como o som distante dum órgão numa igreja, perdendo todo o sabor a desespero e angústia.
Sentiu que o moviam, sacudiam e picavam. O caminho era muito difícil de transpor, mas voltou ainda.
“Tantos anos de trabalho honesto para nem sequer gozar a vida! Tão rico, tão novo ainda, não pode morrer! E, para mais, longe de sua casa…” A mulher chorava, passando-lhe um braço à volta do tronco.
Benjamim tardou em compreender esta linguagem. Os seus olhos doutro mundo estavam dilatados com a incoerência do que ouvia. Depois teve um vislumbre de pena dela, dos seus anéis, de toda a sua comodidade de homem rico. Fez um movimento para ficar, tão rápido como uma daquelas faíscas que ziguezagueavam no espaço.
Percebeu que já não podia voltar para trás.
“Para quê?”, perguntou a si próprio.
“Para quê?”, dizia o irmão. “Hoje ou amanhã tinha que acontecer…”
Lá longe, no horizonte, onde a atmosfera cinzenta da morte começava a tingir-se de rosado, o Firmino parara à espera dele com os grandes olhos claros brilhantes como estrelas, e o mesmo rosto precocemente grave, com que acompanhava o pai.
Aquele bloco insensível que repousava sobre a cama começou a arrefecer.
– Morreu! – disse uma voz.
Benjamim Trovisco não ouviu esta palavra ou, se a ouviu, não a entendeu. Lançara fora a última moeda, que num derradeiro apego às coisas do mundo, conservara no bolso, e afastava-se muito leve sobre a planície cinzenta.